terça-feira, 6 de agosto de 2013

Transparência não é BigBrother

É pauta recorrente nos meios de comunicação a transparência de governo. A lei da transparência e de dados abertos é uma realidade no campo jurídico e político. No entanto, ainda há dificuldades dos agentes políticos em implementar seus mecanismos de transparência como os "Portais de Transparência". A legislação é clara em alguns aspectos como, por exemplo, quando afirma que os dados devem estar dispostos de maneira acessível e de fácil compreensão para o cidadão. Mas a legislação é omissa quanto a quais dados devam ser divulgados, como por exemplo, a polêmica relação de salários dos servidores públicos. Não vamos aqui entrar nos méritos legais como nas análises mais técnicas, vamos apenas tratar sobre o aspecto social da necessidade de transparência de governo.
Venho escrevendo muito sobre a cultura política brasileira nos últimos meses. O fato de termos uma sociedade muito influenciada pelas permanências sócio-políticas dos períodos colonial e monárquico, contribui muito para não termos uma tradição democrática mais participativa e transparente. É muito mais lógico para o governante (de maneira geral) tomar decisões de maneira autoritária e planejar (quando há planejamento) de maneira autocrática.
A grosso modo, os órgãos públicos, sobretudo as prefeituras no interior, se assemelham muito a pequenas monarquias. O modus operandi é praticamente o mesmo, tanto do próprio prefeito quanto o comportamento das assessorias. É clara a certeza de que a vontade do "primeiro mandatário" do município é mais importante que a vontade dos demais. Numa perspectiva democrática, o prefeito não é nada mais que um cidadão a serviço dos outros. Mas a sociedade de maneira geral não o vê dessa forma.
Neste contexto, a transparência de governo nas prefeituras interioranas fica condicionada à vontade do prefeito. A divulgação dos dados das contas públicas, sobretudos as informações sobre a folha de pagamento, são encaradas como uma subversão desta ordem social, pois afronta diretamente o "mandatário". Como se colocasse o prefeito sob suspeição!
No entanto, infelizmente, estamos passando por um período de excessos do senso comum de matriz liberal sob a égide do pensamento capitalista. Isto é, passamos por um período de transição que mistura a política autoritária com o industrialismo da era moderna e as fortes influências do desenvolvimentismo dos anos 1970. O resultado disso é visto nos órgãos públicos burocratizados abarrotados de papéis com enfoque nas obras, nos aspectos quantitativos, etc. A eficiência é justamente o oposto: o foco na qualidade, na minimização dos recursos para execução do trabalho e, sobretudo, a superação do modelo industrial.
A grande polêmica deste assunto é o tratamento dado na divulgação dos salários dos servidores públicos. Isto realmente desacomodou as pessoas envolvidas, ou seja, os servidores públicos de maneira geral são contra ao que preconiza o STF. Divulgar os salários associados ao nome de cada servidor, na minha opinião é um excesso daquele senso comum. Pergunto qual é a necessidade do cidadão em saber quanto percebe cada servidor público? Creio que a necessidade do cidadão é saber quanto os órgãos públicos gastam com salários. Mas o maior argumento dos que defendem a exposição pública da folha de pagamento dos servidores é o que estes são pagos com recursos públicos, portanto o povo tem que ter acesso. Pois bem! Muitas empresas trabalham exclusivamente para os governos, portanto a origem dos recursos do gasto com pessoal destas empresas também é pública! Mais ainda: as empresas que detêm concessões públicas como as que exploram o transporte coletivo, as telecomunicações, etc, tem a origem de seus recursos em atividades concedidas pelo poder público! Na lógica de senso comum, os salários dos funcionários destas empresas deveriam ser divulgados!
Não podemos transformar a transparência numa espécie de BigBrother. Acessar informações das individualidades não interessa para a coletividade. O que importa para o exercício da cidadania é entender sobre os gastos públicos, o que infelizmente 95% da população desconhece. E mais infeliz ainda é o fato de, no Brasil, como dizem, "a corda sempre arrebenta do lado mais fraco", e o servidor público concursado vai ter seus contracheques publicamente expostos para que os escandalosos contracheques dos agentes políticos e dos magistrados não sejam o foco das atenções.

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